sábado, 31 de dezembro de 2011

Do que 2011 trouxe consigo

O ano foi 2011 pra todo mundo, mas cada um teve o seu ano. Não importa se compartilhamos dos mesmos dilemas pela TV, se nos questionamos a respeito das mesmas coisas pelo Twitter ou se criticamos os mesmos assuntos que lemos nos jornais a respeito das decisões dos nossos mesmos governantes. Cada um vive e sente o tempo de uma forma diferente. Pra mim, 2011 foi um intervalo curto demais entre 2010 e 2012. Não peço que fique mais, mas também não digo que já vai tarde. Eu prefiro acreditar que tudo acontece a seu tempo. 

Esse foi o ano em que completei duas décadas de vida. Tempo demais para algumas coisas e de menos para outras. Hoje eu consigo ver claramente como já fui (bem mais) arrogante e prepotente. Eu sei que sou, muitas vezes. Taí um dos meus grandes defeitos. Ao mesmo tempo, foi o ano em que, embora essa realidade tenha se assentado aqui, percebi que ainda não vivi nada de coisa nenhuma e que 20 anos não são nada. E que maravilha perceber isso. 

Desde o ano de 2003, quando uma coisa quebrou toda a linearidade dos anos anteriores, eu me propus a fazer com que a cada ano algo realmente muito bom acontecesse na minha vida. Esse ano, embora não pareça bom o que vou dizer, foi o ano das decepções. Eu me decepcionei profundamente com coisas e pessoas. Mas o quanto aprendi com tudo isso, nada alegre poderia me ensinar. E eu acho ótimo que tenha sido assim. Nenhum aprendizado é indolor. Então foi mais um ano em que garanti algo realmente incrível. 

As pessoas, fora alguns tipos que já me decepcionaram muitas vezes antes, foram amigos. Amigos recentes, amigos do tempo da escola, amigos do tempo de brincar na rua de casa. Muitos deles. Gente que elege prioridades estranhas, que não sabe se impor, que mente pra si mesma, que decepciona os amigos e que faz bobagem da própria existência. Eu prefiro nem me alongar nesse assunto. Tirei proveito disso de forma indireta e aprendi com os erros alheios, porque "não se vive tempo suficiente para cometer todos os erros", é o que basta.

As coisas, bom... A coisa. O que me decepcionou esse ano foi o Jornalismo, que até outro dia eu tinha como "o curso" que escolhi pra mim. Hoje, eu já consigo vislumbrar como "a profissão" que aconteceu pra mim. E me perdoem se falo tanto de Jornalismo, mas é que além de ser parte significante da minha rotina, é intenso e instigante demais para ser ignorado ou só eventualmente comentado. 

Eu disse que não parecia bom... Mas, é sim. Essas decepções são só um choque de realidade. Eu, que sou uma otimista incorrigível, preciso ser mais pé no chão, mais analítica, mais crítica, mais observadora, mais sensível, mais racional, mais objetiva, mais focada, mais determinada. Menos idealista, menos sonhadora, menos aquariana, menos apaixonada, menos parcial, menos efusiva, menos cega, menos volúvel, menos etérea... 

2011 foi ano em que eu realizei um sonho e foi aí que ao mesmo tempo em que algumas ideias morreram, várias outras surgiram. Desde o começo do curso de Jornalismo, quando eu vi que essa conversa, de que não há espaço para jornalistas no Piauí, é um grande achismo de quem é de fora da área, comecei a imaginar onde eu gostaria de exercer a profissão dentro do estado. Eu sabia que queria escrever. Jornalismo, pra mim, se faz de palavras escritas (e lidas!). 

Eu passei a vislumbrar um dos jornais impressos da capital como o lugar onde eu poderia realmente pôr à prova o que eu achava sobre o jornalismo, que nunca foi o que imaginei para a minha vida, mas que a partir do momento em que passou a fazer parte da minha realidade, me fez sonhar com lugares e modos de fazer e coisas a aprender. 

E aí eu consegui. E foram (quaaase) 7 meses de uma rotina diária que me ensinou um monte de coisa, e a principal é que eu NUNCA vou saber o suficiente para que os acontecimentos, os dados e as pessoas deixem de me pegar de surpresa. E isso é a coisa mais incrível que eu poderia descobrir. 

Ao mesmo tempo, como falei antes, me decepcionei com várias coisas. E que eu sei que se não fosse lá, seria em outro lugar. Como foi antes, quando me arrisquei em outro outra forma de fazer jornalismo. O baque foi imediato. Isso porque o jornalismo nunca foi uma coisa que eu, um dia, tivesse cogitado fazer. Quase todos os dias me pergunto em que situação eu estaria se tivesse sonhado e feito planos para o futuro com essa carreira. Talvez já tivesse desistido. 

E 2011 também trouxe coisas e pessoas que me fizeram continuar querendo ser jornalista com exemplos de como ser bom, justo e honesto, apesar de tudo e qualquer coisa. Ou, pelo menos, ser o melhor, mais justo e honesto possível, dentro das possibilidades disponíveis.

Eu sempre fui do tipo que nunca teve pressa de crescer e fazer "coisas de adulto". Eu nunca fui daquelas meninas que usavam a maquiagem da mãe ou que queriam chegar tarde em casa. Eu sofro de velhice precoce às avessas. Deve ser ruim, eu acho. Quando eu tiver 40 anos vou querer fazer coisas de adolescente, porque hoje eu ainda sou do tipo que prefere um filme em casa do que uma ~balada animadérrima~. Por isso, não me animo em chegar logo ao fim, alcançar logo todos os meus objetivos, queimar etapas, passar por cima de ninguém. Até hoje, desde que comecei a fazer planos para o meu futuro, sempre alcancei o que desejei. Eu sou impaciente e ansiosa, mas não sou desesperada.

Acho que o que mais desejo pra 2012 é aprender tudo o que eu tiver de aprender, sejam lá quais forem meus erros atualmente. E se tiver que ser doloroso, se tiver que ser lento, se tiver que ser decepcionante, se tiver que me fazer sofrer... Que faça. Que 2012 traga consigo muito mais do que me trouxe 2011 e que leve embora o que não me for útil. 

sábado, 3 de dezembro de 2011

Um disparo, dois tiros

Ela levantou, mas não acordou. O corpo ficou na cama bagunçada, a cabeça sobre os volumes macios que sempre deixavam uma dor leve no pescoço, pela manhã. Hoje, ela acordou sem dor. Sem vontade, sem rumo, sem si. Ela deixou a um canto a camisola lilás, girou de leve a maçaneta e acariciou repetidamente o chão do corredor com os pés pequenos. Ela sequer olhou para trás, sabia que o destino era adiante. 

Agora ela era como sempre quisera ser, só sensações. Sentiu bem mais o aroma meio acre do cajueiro em flor, do asfalto quente sob o sol do início da manhã e da fumaça dos carros. O cenário era bonito, porque era real, sincero e tinha gente. Ela sempre gostou de gente, embora nunca tenha se sentido muito bem entre elas. Elas funcionavam como a TV para seus usos e satisfações; eram só companhia para um momento de solidão. No caso dela, o momento durou a vida inteira. Até que as pessoas serviram bem. 

Agora ela notava como sempre fora irrelevante para todos e agradecia em pensamento não estar mais presa a nada disso e não ter nada preso a ela. Já não precisava amarrar o grande sorriso no rosto, tão grande que escondia lágrimas eventuais. Ela lembrou que guardava o sorriso entre as páginas dos livros que lia, antes de dormir. Durante a noite, eram os romances que recarregavam seus dentes e lábios unidos fixos em felicidade para a manhã seguinte. 

Caminhou por mais um longo tempo, aproveitando a sensação de ser vista por ninguém. Desamarrou a corda do cachorro preso ao poste, cuspiu do alto e fez chover, roubou o pudor da gente fraca e mostrou a todos que quando alguém vai e não olha pra trás, não adiantam mais as palavras bonitas. Ela sentia, mas não ouvia mais nada. Nem os ganidos chorosos nem as buzinas alucinadas. Ela era toda paz. 

A noite chegou e ela se sentou no concreto frio, observando a movimentação diminuir, como a água que se esvai. Abraçou os joelhos e começou a pensar que aquilo também não fazia sentido. Não sabia o que era pior. Estar sozinha junto de muitos ou ter a companhia dos mil pensamentos, realistas demais. 

Levantou e sentiu que ia chorar, não havia saída. Não importava o quanto andasse, sempre havia mais uma esquina. Ironia cruel levando em conta a provinciana dimensão da cidadezinha. Ela caminhou até que algo a fez parar. Um olhar a atravessou no peito. Ela sabia que aquela não era a dor de não ser vista, porque já estava acostumada. Sentiu como um tiro, a sensação já conhecida. Um impacto que deixou os instantes seguintes em câmera lenta. Quente e molhado, só que agora no peito, não na têmpora. Dessa vez o calor aquecia, não queimava. Por um momento ela pensou que pudesse estar ouvindo um som ritmado e grave, profundo, como se latejasse. Mas ela realmente não podia ouvir, vinha de dentro do peito. E ela foi caindo, devagar, primeiro joelho fraquejando, depois outro, e o cheiro doce e rubro coloria a noite. Era visceral. 

O olhar caminhou até ela, trazendo um homem. Ele dizia coisas que ela não podia ouvir, mas quem se importava, agora? Ele podia e queria vê-la. Ela sentia o impacto de ser fuzilada a cada novo toque. Se contorceu em angústia e aquilo tudo parecia um sonho ruim dentro de um outro sonho ruim, abriu a boca e nenhum som saiu. Os os marejaram, embaçaram, reviraram e ela apagou. 

Acordou com o som que parecia vir de dentro, vindo de fora. A cabeça doía, o pescoço também. O ouvido estava grudado na caixa de coração que tinha cheiro de homem, de meia noite e de roupa nenhuma cobrindo corpos. Ele ressonava e ela assistia, sentindo o peito atravessado por alguma coisa que não se podia dizer o que era. Só era quente. Parecia vir de longe e ela nunca iria poder dizer como fora atingida. Ela pra sempre só irá lembrar de um disparo. 

domingo, 27 de novembro de 2011

Sobre ser só



Quando as coisas vão bem, é que fica um vazio. Parece que elas vão tão bem, que se vão, assim que estão prontas. Encerram-se os trabalhos e fica só o cheiro de plástico aquecido do netbook em cima da mesinha. Pesquisei, escrevi, reli, corrigi, mandei e agora não sei mais o que fazer da vida. Eu sinto demais a ausência de um sentido nas coisas, de alguém com quem falar e de uma vírgula no meio da frase. 

Eu poderia fazer ligações e marcar encontros com pessoas que gostariam da minha companhia, mas que eu sei que não me fariam a companhia de que eu preciso. Porque eu ainda não encontrei alguém que compreenda cada nuance do que sou, e eu queria alguém com quem eu pudesse rir, chorar, tocar a campainha e sair correndo ou ler uns trechos lindos de João Ubaldo Ribeiro sem ser mal interpretada. 

E não me olha assim, que eu não estou falando de homem. Falo de gente. Uma maranhense um ano mais nova me serviria, também um velho paulista casado e fiel. Não é dessas coisas que estou falando, só é bom conversar, sentir que há alguém no mundo que consegue entender que você não é louca por pensar em fazer algumas coisas, só pensar, não necessariamente fazer. Mas, ainda não há.
Eu sei que se eu contasse tudo o que sou, sinto, penso e quero, as coisas seriam bem mais difíceis pros outros, mas bem mais simples pra mim. Eu vou vivendo hipócrita até onde meus impulsos suportarem. Às vezes é fácil, as tentações são leves, superáveis. Às vezes o esforço é infinito, duro, palpável. E me rasga em duas. Mas é assim que é, dolorido, como tudo que é bom nessa vida.

Eu nunca choro pensando nisso, mas sei que deveria. Eu teria uma enxaqueca desgraçada, que só passaria se eu dormisse, e aí eu contabilizaria cerca de três horas a menos pensando nisso tudo. Eu até acho que as coisas nas quais eu penso passam sempre pela cabeça de todos, mas a mim incomodam mais. Falar a verdade sempre, apontar todos os defeitos, desmascarar os mentirosos, tirar a roupa de todo mundo, enfiar o pé na porta, dar um tiro pro alto, pedir a palavra, esfregar na cara, dentre outros mais... Mas a gente não faz nada nisso, nunca faz.

E aí o dia acaba e eu comento alguma coisa, quase sempre tento me fazer rir, pra me sentir menos mal por agir assim, contra o que eu sou de verdade. Eu não sou falsa com ninguém, eu sou falsa comigo. Quanto tempo mais será que eu aguento? Porque eu não quero fugir, quero ficar e ver no que dá. Quero me ver tomar uma decisão. Sou só eu que me compreendo e que me sei. Só não me basto. Só, não me basto. 




quarta-feira, 21 de setembro de 2011

A primeira morte que chorei

Assis Fernandes

Eu estava indo lá pro Jacinta Andrade para uma pauta de bairro. Sem água, sem energia... Eu que ando meio sem energia, mas eu gosto de matéria de bairro. As pessoas são mais gentis do que aquelas de terno e com as quais a gente conversa rapidinho pelos corredores dos lugares, como se eles fossem mesmo muito importantes e a gente precisasse "correr atrás" de verdade para conseguir uma declaraçãozinha, só pra constar. Fulaninho afirmou que sim. 

A avenida Presidente Kennedy me dá paz quando eu passo da altura da Dom Severino, porque fica bem calmo e me lembra a Zequinha Freire, com todas aquelas borracharias e gente sentada na calçada, e que é caminho pra minha casa. Já chegando no Zoobotânico, tem mais verde pelos cantos e uns caminhões carregados de um monte de coisa que eu nem sei o que é, crianças formam grupos caminhado para casa depois que saem da escola.

Algumas delas pararam. Eu parei o meu olhar que seguia o nada, recostada sobre o banco traseiro. Havia um animal deitado ali no canteiro central. Eu fiquei apreensiva. Ai, meu Deus, o que será? Será que ainda está vivo? Deve estar sofrendo. "Pare o carro ali na frente, por favor. Olha, tem alguma coisa ali". Era grande, pensei que era um cavalo, mas não tão grande assim. Desci, atravessei, cheguei ao canteiro. Era uma fêmea de... "Burro" e "Jumento" não nomeiam bem um bichinho daqueles. Mas é assim que chamam. Os olhos abertos. A barriga enorme. Havia uma vida ali dentro dela. "Foi um caminhão que pegou, ela se abaixou ali na avenida [apontando o dedinho magro e de unhas roídas] pra parir, e aí o caminhão foi e atropelou ela. A bichinha. Atropelou. Nem parou. Foi-se embora". 

A visão do animalzinho se embaçou diante dos meu olhos e eu comecei a fazer umas perguntas, só pra não pensar direito. Anotei tudo e notei um pouco além. Havia sangue ali, escorrendo um pouco de onde viria sua cria. Um homem vinha montado em um cavalo cor de caramelo. "Eita, a 'Buneca' morreu. O 'Lorim' nem sabe, tá trabalhando. Ele vai ficar triste. Eita. A 'Buneca' tava pra parir". Acho que ele falou com ele mesmo. O olhar dele para o bichinho fez, uma vez mais, a minha visão embaçar. Engatei mais algumas perguntas, distraí a ele e a mim. Ele foi embora, galopante, sob o sol de quase meio dia. Olhei mais uma vez. Desisti de tentar saber mais alguma coisa. Voltei pro carro. As crianças passaram e acenaram um "tchau" tímido. "Tchau", acenei. 

O carro partiu. O caminho seria longo, ainda. Novamente me recostei sobre o banco do carro e procurei fugir dos olhos do motorista que às vezes me vigiam pelo retrovisor. Assim as lágrimas poderiam correr livres... Nunca antes uma morte, em pauta, me havia feito chorar. Me senti mais humana, mais sensível, mais capaz de perceber a dor outro, ainda que o outro seja uma burrinha prenha e morta. 

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

De como estudantes baderneiros pararam Teresina

Há algum tempo acompanho as manifestações, de entidades de classe e movimentos estudantis, contra um possível aumento do valor da passagem dos ônibus em Teresina. Inicialmente, como estagiária de jornalismo/repórter, mas também como cidadã e usuária do transporte público da capital. 

Lembro que há mais de dois meses, umas 100 pessoas seguiam pelas ruas da capital até a Prefeitura Municipal de Teresina, realizando passeatas tranquilas e que, muitas vezes, sequer vinham a público por meio da mídia local. A luta incluía o pedido de auditoria (lembrem-se, há mais de dois meses) do transporte público, o que levaria à revisão da planilha utilizada oficialmente pela PMT na determinação do valor do passe. Vale dizer que as conversas realizadas com a prefeitura durante os (muitos) dias de protestos pacíficos, nunca levaram a um debate consistente na intenção de que uma avaliação justa do transporte fosse realizada. Na auditoria, seria possível notar as péssimas condições dos pontos de ônibus que, principalmente em uma cidade como Teresina, maltrata e, porque não dizer, é "vândala" com o usuário? Como, por exemplo, a quantidade de veículos que não atende satisfatoriamente a população, tendo em vista o tempo que esperamos nos pontos de ônibus (eu, particularmente, já esperei várias vezes por mais de 1h, em dias normais). A qualidade e a acessibilidade dos ônibus, que quantos cadeirantes já deixaram esperando nas paradas? O absurdo que é, em nossa cidade, que já cobrava caro quando o passe custava R$ 1,90, não haver integração entre as linhas de ônibus, que realizam percursos mal planejados; afinal, quantos estudantes, de quantos bairros da cidade, precisam pegar dois ônibus para chegar às Universidades públicas instaladas na capital (eu, particularmente, precisava pegar dois ônibus para ir pra Uespi e preciso pegar dois pra ir pra Ufpi, além dos dois pra voltar); isso sem contar as viagens extras, porque a minha vida não se resume a ir para a Universidade.

Estou citando exemplos particulares, mas imagino quantos outros problemas os 100 estudantes, que já se manifestavam pelas ruas de Teresina pedindo a revisão da planilha de custos, reforço, há mais de dois meses, poderiam apresentar para justificar a revolta com a possibilidade do aumento da passagem. Então, o prefeito de Teresina, Elmano Férrer (PTB), assina o decreto que determina o reajuste da passagem de ônibus, de R$ 1,90 para R$ 2,10, na quarta-feira (24), o qual é divulgado apenas na noite de sexta-feira (26). O que poderia ser convertido em um fim de semana que acalmaria os ânimos das pessoas que fazem parte das entidades que atuam em defesa do usuário do transporte público, se transformou em dois dias de intensa mobilização virtual, estudantil e trabalhista. Estava decidido: o gestor de Teresina e, porque não, Teresina inteira, ouviria os protestos.

Na manhã da segunda-feira (29), mais de 2 mil pessoas, absolutamente revoltadas com o aumento e, além disso, com a atitude da divulgação do decreto somente dois dias depois de realizada a assinatura; se reuniram no canteiro central da maior avenida da capital piauiense e debateram formas de atuação que, finalmente, seriam ouvidas. Eu volto a lembrar que sei que há mais de dois meses as tímidas manifestações aconteciam, porque elas foram minhas pautas quase semanais desde que comecei a estagiar como repórter, e as acompanhei sempre. Nessa primeira segunda-feira de protestos, muitos jovens sofreram a repressão da tropa de choque da PM piauiense e sentiram o ardor dos sprays de pimenta, a dor das balas de borracha e a força maior da tentativa de ter sua voz calada. Sim, sim, ações condenáveis foram realizadas. Eu, particularmente, não concordo com a depredação de ônibus e nem com a pichação de monumentos da cidade, mas acompanhei a manifestação desde o primeiro dia e sei que esses atos foram produzidos por pessoas que não fazem parte das entidades que estão encabeçando o movimento e se aproveitam da luta pra cometer, sim, atos de vandalismo. Isso é um fato. No entanto, o movimento não é um movimento de vandalismo. A luta não é uma luta violenta. A maioria dos grupos que hoje "lideram" os protestos, já atuam no movimento em defesa do transporte público há muito tempo. Aliás, muito mais que os dois meses que eu os acompanhei, mas estou expondo aqui minha visão pessoal sobre os fatos. 

Nessa tarde, seis jovens foram levados à central de flagrantes da PM, dois deles menores de idade. Foram liberados em seguida, a pedido dos outros manifestantes. Em vários portais jornalescos locais, o grupo já era considerado violento, agressivo e autor de atos de vandalismo. De acordo com vários outros veículos de comunicação da cidade, a atuação agressiva partia de todo o coletivo. No entanto, quem estava lá, sabe que essa não era a realidade. E então, pessoas que presenciaram 10 minutos das 10 horas de manifestação, ou que tiveram apenas acesso às imagens e falas convenientemente divulgadas por muitos veículos locais, se acharam suficientemente capazes de julgar os atos agressivos cometidos e, mais, todo o grupo de estudantes e servidores que foram às ruas protestar. No dia seguinte, os atos novamente começaram cedo e terminaram tarde, com o grupo tomando ruas e parando cruzamentos da Frei Serafim. E no dia seguinte. E no dia seguinte. A ação se expandiu da Frei Serafim para a PMT, Avenida Miguel Rosa, João XXIII, Nossa Senhora de Fátima, Ponte Juscelino Kubitschek, Estaiada, Praça da Bandeira, do Marquês, Ruas Lizandro e Arlindo Nogueira... Eu acompanhei as manifestações desde o primeiro dia, quase que inteiramente. Vi atos agressivos, mas vi também estudantes unidos cantando o hino nacional, vi manifestantes formando um enorme cordão humano na avenida Frei Serafim, vi o grupo coordenar o trânsito e liberar a passagem de ambulâncias, vi motoristas promovendo buzinaços em apoio à manifestação, vi passageiros de ônibus presos no trânsito aplaudindo o protesto do grupo, vi PMs apoiando a causa e sendo aplaudidos pelos estudantes, vi pessoas nas paradas de ônibus absolutamente extasiadas com a tomada de atitude por parte dos jovens teresinenses... Uma das falas que recolhi hoje, quando conversei com dezenas de pessoas que assistiam, nas paradas de ônibus da Frei Serafim, o início do quarto dia de protesto, dizia que "Finalmente agora a gente tem alguma esperança de mudar alguma coisa pela ação do povo. Já estava ficando tarde para esse pessoal novo tomar uma atitude e fazer valer a nossa cidadania, a nossa voz". 

Eu, particularmente, fico profundamente decepcionada que tantas pessoas, até muito esclarecidas e inteligentes, se deixem cegar por atitudes isoladas, e convenientemente amplificadas em determinadas mídias, nos protestos, e não consigam compreender a grandeza e a importância do que está acontecendo em Teresina. Há precedentes e ações "violentas" internacionais acontecendo simultaneamente e deixando claro que essa luta é válida e que, por mais agressivo que pareça, pode sim ser positivo de alguma forma. Esses dias serão históricos; essas fotografias e esses vídeos ficarão pra sempre na história dos movimentos estudantis e sociais da capital, tão subestimados até pouco tempo atrás; os dias que presenciamos ficarão eternamente registrados quando vier à tona os temas de mobilização virtual e cibercultura na capital; as palavras de ordem ecoarão por dias na cabeça de jovens, adultos e idosos; a desestabilização causada no sistema de segurança e transporte de Teresina por conta de "uns baderneiros" será arduamente discutida por gente inteligente e consciente do nosso estado. É possível unir as vozes e se fazer ouvir, sim. Eu percebo que todos esses dias poderiam ser traduzidos com a imagem de alguém que pede, desesperadamente, a palavra, dentro de um ambiente cheio de gente completamente apática. Quem não consegue ver, agora, dentro de um ônibus absolutamente lotado, às 13h, na avenida Frei Serafim, inúmeros semblantes cansados e completamente passivos diante daquela situação. O calor, a lotação, a qualidade... Finalmente chegou o momento em que gritaram: Ei! Acordem! Olhem a situação em que vocês estão e o quanto pagam por isso! A gente precisa fazer alguma coisa!

Infelizmente, foram necessárias atitudes incisivas para que esse grito fosse ouvido. É possível que, com intenções genuínas e sinceras da grande maioria, uma cidade inteira seja barrada/parada/estrangulada/paralisada, finalmente, para discutir uma questão que já é parte do nosso cotidiano há muito tempo e que nunca foi levada ao debate público como agora. Estamos aqui e queremos ser ouvidos. É possível. 


segunda-feira, 30 de maio de 2011

Do que se quer

"Uma noite ela me disse: 'Quero me apaixonar!'
Como quem pede desculpas pra si mesmo 
A paixão não tem nada a ver com a vontade..."


Eu não sei quanto tempo mais eu vou tentar controlar o que sinto com relação a tudo. E me questionar, quase me culpando, por sentir muito ou não sentir nada. Por ser desse jeito ou daquele outro. Por querer isso e não aquilo. 

Eu queria conseguir me concentrar nas questões realmente importantes da minha vida, as que merecem prioridade, mas eu não consigo. Eu não sei se sinto mais raiva ou inveja das pessoas que dizem que são extremamente focadas e determinadas e perseverantes e persistentes... Porque eu não sou. Eu sou fraca, covarde, sem determinação, sem foco. Eu desisto fácil, eu canso rápido, eu me rendo logo, eu me entrego depois de poucos golpes. Não precisa o chão sumir sob meus pés, eu simplesmente já caí, pro fundo, de qualquer coisa que ainda me mantinha de pé. 

É meio louco pensar que não dá pra controlar o que você deseja intimamente, de verdade. Desejo você, só você, loucamente você... E se esse "você" não te deseja de volta, dói tanto, não é? Quantas vezes já deitei na cama, olhei pra cima e pensei que se alguém pudesse me ouvir e atender meu pedido, seja lá quem fosse, que simplesmente me fizesse deixar de querer. A dor de sentir saudade do que nunca existiu é a pior de todas. Pensar nas infinitas possibilidades do que poderia ter sido, é tão cruel. E a gente é egoísta e não consegue gostar sozinho, não existe. E não só com pessoas. Eu queria me sentir realizada fazendo outra coisa da vida, alguma coisa que me deixasse rica, por exemplo. Eu não queria perder tempo me questionando quanto ao que eu estou fazendo pelo mundo, pelo meu país, pela minha cidade. Mas eu me questiono e me envergonho de como minto pra mim mesma diante de tanta coisa que eu poderia estar fazendo, mas não estou. Simplesmente vejo a oportunidade passar por mim e, então, aceno. Ela vai voltar, eu penso. Mas não volta. 

Seria perfeito adaptar as sensações e as percepções diante das coisas, das situações, das pessoas. Nunca mais haveria clima pesado e sorriso amarelo. Acho que a gente podia se gostar, né? Acho que sim. Então tá. Aiai, eu já te amo. 

Tudo que a gente pensa, de verdade, profundamente, são teorias sobre o que fazemos enquanto estamos respirando. Teorias que podem ajudar a ver tudo de um jeito mais simples, ou simplesmente facilitar a dificultar um negócio que já não é tão simples: a vida. Eu quero saber porque há tanto dentro de mim a ser exposto e contado e questionado e criticado e aperfeiçoado - como pessoa, como profissional, como filha, como amiga, como mulher, como cidadã, como Maria - e simplesmente é ignorado POR MIM MESMA. O processo de auto-conhecimento é difícil e ingrato. Reconhecer erros e falhas e incapacidades é terrivel e absurdamente frustrante - principalmente quando você admira essas potencialidades em outras pessoas, mas  não importa o que você faça, você não as possui.

Eu já não sei mais o que quero dizer. Mas já há muitos dias que existe algo em mim que questiona tudo e todos e que não admite mais a minha própria postura diante do mundo. E ao mesmo tempo que eu me conformei com muitas coisas e acho que esse é o caminho pra se adquirir mais paciência; acho também que percebi que não posso ficar parada diante de tudo o que acontece, passiva. 

Eu quero me apaixonar e chorar até sentir enjoo, de tanta saudade. Quero fazer tudo errado e ter alguém que me ensine com paciência o jeito certo de fazer. Quero me sentir bem só na minha própria companhia. Quero ter alguém pra desejar a companhia em qualquer momento da minha vida. Quero paz, quero agitação, quero tudo que eu possa me oferecer... E eu já nem sei o é querer. 

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Dia do Jornalista

Quantas vezes eu já quis mudar de curso? Olha, confesso que não lembro, mas talvez nem tenham sido tantas assim, as vezes em que pensei nisso. É que eu sou ruim em matemática e não conseguiria fazer as contas, agora. Aliás, taí um motivo de eu ter escolhido Jornalismo. 

Eu sempre digo isso, mas hoje é dia de eternizar o pensamento: se eu disser que entrei no curso de Jornalismo apaixonada e cheia de planos e sonhos, vou estar mentindo. Eu sentia uma ponta de invejinha dos colegas de turma que diziam ter escolhido o curso porque eram "apaixonados"; era isso: paixão. Eu só simpatizava. Confesso que nem rolava uma paquera. Eu sentia, sim, inveja dos meus companheiros - também calouros, mas parecendo tão mais bem resolvidos e realizados. Eu fiz Jornalismo porque sabia exatamente o que NÃO fazer: exatas ou saúde. E qualquer outra coisa de humanas parecia que não ia me manter empolgadzzZZZzz... 

Taí, acho que foi só por isso, por não ter esperado nada, que eu não desisti até hoje e, de uns meses pra cá, não tenho pensado nem uma vez em abandonar isso tudo. Se eu tivesse entrado na UFPI esperando tudo que de melhor o curso de Jornalismo pudesse me oferecer, eu estaria deprimida a essa altura do campeonato. Certeza, eu me conheço. 

Logo no nosso primeiro período, desinformados, iludidos, sonhadores... A queda do diploma. Nós nem sabíamos direito o que pensar. Protestamos, fomos à Frei Serafim, gritamos... Mas, falo por mim, eu não tinha ideia do que aquilo representaria, exatamente, para nós. Só tinha na cabeça a certeza de que alguma coisa mudaria... E pra pior. Bom, o tempo passou, começamos a nos envolver, a conhecer pessoas, rotinas, realidades... E a questão do diploma virou um detalhe mínimo diante do mundo que estava se mostrando, cada vez mais louco, à nossa frente. 

Foi aí que eu me apaixonei. Demorou, mas esse negócio me conquistou. Depois que eu deixei de me questionar sobre como seria, o que eu faria, onde aconteceria, e decidi viver aquilo ali, aprender ao máximo, aproveitar tudo, aí sim, eu me deixei conquistar. Hoje, eu não me imagino fazendo outra coisa e nem sei como pude, um dia - um dia que, hoje, parece muito distante - pensar em desistir ou escolher um outro caminho. 

Hoje, estou exatamente na metade do curso do Jornalismo, início do 5º período. E a certeza que eu tinha de que tudo mudaria ou de que tudo continuaria igual, ou a certeza de qualquer outra coisa, naquele dia em que caminhei gritando e protestando contra sabe-se-lá-o-quê numa manhã muito quente do início de 2009, já não existe. Eu não tenho certeza de coisa nenhuma. Eu só sei que depois de dois anos vivendo isso, essa realidade, esse modo de observar as coisas, eu finalmente sei bem o eu quero, de verdade: continuar vendo o mundo com esse "óculos" interacionista-simbólico-behaviorista-freudiano-etnográfico-comunicacional. :P

Quando eu finalmente puder dizer que sou Jornalista POR FORMAÇÃO - ;) - e estiver com meu diploma em mãos - que vai valer cada xerox, cada feijoada ruim do RU, cada professor que não foi dar aulas, cada ar-condicionado quebrado em pelo B-R-O-bró, cada seminário preparado na véspera, cada gato doente que cruzou meu caminho pelos corredores do CCE... - eu vou poder dizer que me orgulho do que conquistei não porque ser Jornalista é glamouroso e #mimimi, ou porque foi dura a caminhada - porque nem está sendo tanto assim, vamos falar sério, né? haha - mas porque eu realmente vou acreditar naquilo que estarei fazendo. Porque apesar de ter visto/ouvido/lido muita coisa que quase me venceu, eu acredito que a gente pode muito. Muito e muito bem.  

Feliz dia do Jornalista - em especial para os ainda não Jornalistas da Universidade Federal do Piauí. ;)


ps: manhã o CA, na pessoa do Senhor José Orlando, vai pagar o almoço de todo mundo - no RU, ok? - que twittar esse texto! 

#pegadinhadomalandro hahahaha



terça-feira, 5 de abril de 2011

Eu sou ridícula

Eu me sinto tão ridícula querendo me fazer entender por gente que eu nem sei quem é. Eu só queria alguém que conseguisse dizer com os olhos: "Eu realmente te entendo". É ridículo eu ficar buscando justificativa para as coisas que eu não fiz. Talvez se eu começasse a ir dormir com a inquietação do desejo, as coisas passassem a acontecer, porque, pelo menos, eu as mentalizaria. É ridículo eu já ter feito mais coisas das quais eu me envergonho do que aquelas das quais eu me orgulho. É ridículo eu me pegar me questionando se daqui 20 anos vai haver algum outro ser que carregue por aí o meu DNA. É ridículo eu querer voltar ao tempo em que sabia muito menos, mas a paz de espírito era maior, porque agora eu tenho certeza de que sou ridícula.