Quando as coisas vão bem, é que fica um vazio. Parece
que elas vão tão bem, que se vão, assim que estão
prontas. Encerram-se os trabalhos e fica só o cheiro de plástico
aquecido do netbook em cima da mesinha. Pesquisei, escrevi,
reli, corrigi, mandei e agora não sei mais o que fazer da vida. Eu
sinto demais a ausência de um sentido nas coisas, de alguém com quem falar e de
uma vírgula no meio da frase.
Eu poderia fazer ligações
e marcar encontros com pessoas que gostariam da minha companhia, mas que
eu sei que não me fariam a companhia de que eu preciso. Porque
eu ainda não encontrei alguém que compreenda cada nuance do que sou, e eu
queria alguém com quem eu pudesse rir, chorar, tocar a campainha e sair
correndo ou ler uns trechos lindos de João Ubaldo
Ribeiro sem ser mal interpretada.
E não me olha assim, que eu não estou falando
de homem. Falo de gente. Uma maranhense um ano mais nova me serviria, também
um velho paulista casado e fiel. Não é dessas coisas que estou falando, só é
bom conversar, sentir que há alguém no mundo
que consegue entender que você não é louca por pensar em fazer
algumas coisas, só pensar, não necessariamente fazer. Mas, ainda não há.
Eu sei que se eu contasse tudo o que sou,
sinto, penso e quero, as coisas seriam bem mais difíceis pros outros, mas bem
mais simples pra mim. Eu vou vivendo hipócrita até onde meus impulsos
suportarem. Às vezes é fácil, as tentações são leves, superáveis. Às
vezes o esforço é infinito, duro, palpável. E me rasga em duas. Mas é
assim que é, dolorido, como tudo que é bom nessa vida.
Eu nunca choro pensando nisso, mas sei que
deveria. Eu teria uma enxaqueca desgraçada, que só passaria se eu dormisse, e aí
eu contabilizaria cerca de três horas a menos pensando nisso tudo. Eu
até acho que as coisas nas quais eu penso passam sempre pela cabeça de
todos, mas a mim incomodam mais. Falar a verdade sempre, apontar todos os
defeitos, desmascarar os mentirosos, tirar a roupa de todo
mundo, enfiar o pé na porta, dar um tiro pro alto, pedir a
palavra, esfregar na cara, dentre outros mais... Mas a gente não faz nada
nisso, nunca faz.
E aí o dia acaba e eu comento alguma coisa, quase sempre
tento me fazer rir, pra me sentir menos mal por agir assim, contra o que eu sou
de verdade. Eu não sou falsa com ninguém, eu sou falsa comigo. Quanto
tempo mais será que eu aguento? Porque eu não quero fugir, quero ficar e
ver no que dá. Quero me ver tomar uma decisão. Sou só eu que me
compreendo e que me sei. Só não me basto. Só, não me basto.