domingo, 11 de março de 2012

Relatos de por que eu bocejo quando alguém conversa

Às vezes eu bocejo fingindo desinteresse pra que ninguém me ache minimamente interessante e não tente puxar conversa. Eu gosto de conversar, gosto até demais, mas tem dia que não estou pra nada disso. Ainda assim parece que se eu não tenho o dom, tenho a cara de quem ama escutar o mimimi alheio de todo dia.

Naquele dia quente pra caramba de fevereiro o velhinho sentou ao meu lado no ponto de ônibus da Praça do Fripisa e me veio com uma história de que o filho estava se formando em breve em Direito mas ainda não tinha emprego. Eu voltava da Ufpi, em um dia de férias, depois de resolver umas coisas sobre a documentação do estágio. Quase disse pra ele que eu estava pior, mas, sei lá, vai que o filho dele tem umas crianças a quem precisa alimentar. Não tá fácil.

Depois veio com uma história sobre a violência no Dirceu e tal e coisa. Eu também quase disse pra ele que passei a manhã escrevendo e lendo matérias sobre aquilo e que, na boa, não estava afim. Mas só "sorri e acenei". Ele continuou a despejar todas aquelas lamúrias por entre os espaços de dentes que faltavam na boca. Foi-se embora quando chegou o IAPC. Por que é que todos os velhos pegam o IAPC? E o que, afinal, significa IAPC?

Hoje, indo pra já costumeira tarde de domingo na redação, o cara mudo entrou no ônibus. Até o cara mudo vem falar comigo. Eu não gosto disso, de ficar desconfortável, e ele me deixa desconfortável. Ele chega com um pote enorme e transparente cheio de uns bombons de chocolate que eu nunca vi ninguém comprar, mas que ele pega de dentro do pote e encosta nas pessoas, porque o negócio é gelado. Ele faz isso especialmente no rosto das meninas que eu acho que ele, sei lá, quer pegar. Se um dia ele fizer comigo e eu estiver distraída, vou pensar que é um sapo e vou dar um piti. Vai ser obsceno, de tão tosco. Shame on me.

Éramos só eu e outra menina no ônibus. Ele sentou na frente dela mas ela soube ignorar perfeitamente. Aí ele veio pro meu lado com aquela dúzia de bombons gelados, tirando um por um e me mostrando que recheio tinham. Deu vontade de saber libras o suficiente pra pedir pra ele me deixar em paz. Não adiantou e ele seguiu "conversando" e me enchendo a paciência.

Desceu no mesmo ponto que eu e me acompanhou. Tentou pegar na minha mão duas vezes e eu pensei 'Como eu faço pra dizer pra esse cara se mandar?'. Até eu perceber que ele era só mudo, não surdo. Que burra. Falei 'Tchau' algumas vezes e ele fez o que eu costumo fazer: se fingiu de surdo, mas sei que ele não é. O antipático ainda foi comigo até perto da redação e eu quase tentei correr pro 25º BC. Que diabos esse cara queria? Fazer eu convencer a redação inteira a comprar aquelas coisas? Ele fez um gesto que foi quase um coração ~casmão~ e foi embora. Louco, meudeus.

Na volta pra casa, a mulher que sentou do meu lado quis me contar como ela fez pra escolher o presente do neto. Eu lembrei da técnica do bocejo. Bocejei. O bocejo é tipo o fone de ouvido dos sem-fones-de-ouvido, como eu, na atual conjuntura econômico-tecnológica da minha vida. Meu MP4 quebrou e eu não consegui comprar nada do tipo, ainda, pra substituir.

Tenho medo dessas conversas que se estabelecem de repente, sem um motivo mútuo. Como no dia em que o taxista já começou o assunto com "Vocês me desculpem, mas eu preciso desabafar...". Isso foi há duas semanas, estávamos eu e mamãe no táxi. Dá pra imaginar o tipo de coisa que veio depois, né? Problemas com o trabalho, uma passageira paranóica e suspeita de clonagem do carro.  Eu gosto de conversar, saber mais das pessoas. Mas tem dia que... Sei lá, sabe? *bocejo* Boa noite.